O  "TIO  QUINTA-FEIRA"

O "tio Quinta-Feira", de seu nome António Bernardo Quaresma, foi uma figura muito estimada na Benfeita ao longo de muitos anos e ainda hoje é recordado com muita saudade pelos mais idosos.

Filho de António Bernardo e de Maria da Natividade, nasceu em 1888 e casou com Maria de Nazareth Gonçalves, de quem viria a ter dois filhos, Emília de Nazareth Gonçalves e José Bernardo Quaresma, conhecido por "Zé Quinta-Feira".

Carpinteiro experiente de profissão, o tio Quinta-Feira, era especializado em tanoaria (construção de pipas e barris de pequeno e médio porte). Nos seus tempos livres, o tio Quinta-Feira, gostava de tocar guitarra e ainda hoje o seu filho José Bernardo, com 92 anos de idade, a guarda impecavelmente conservada.

Fundou, em 1943, o Rancho Regional da Benfeita "O Mangerico"*, dele fazendo parte, e sendo o seu principal animador, tocando e cantando.

Rancho infantil "O Manjerico"

A ele se deve a construção do chafariz do Areal que trazia água pura da mina da Fonte das Moscas para a antiga Escola Primária, beneficiando os alunos que, até então, iam beber água imprópria à ribeira, que recebia as águas ruças do lagar de azeite e o produto das lavagens de roupa das lavadeiras.

Faleceu em 17 de Setembro de 1974, com 86 anos de idade, 4 meses após o falecimento de sua esposa, a 15 de Maio.

A família "Quinta-Feira"

Absorvido na sua arte

O tio Quinta-Feira

José Fernandes Machado

Agosto de 1954

Eu sinto muito prazer
Em pintar ou descrever
Se posso, sei ou consigo,
Um retrato parecido
D'alguém vivo ou falecido
De quem sou ou fui amigo.

O meu tio da Benfeita,
De quem falar me deleita,
Por ser assim como é,
Nunca a outrem foi igual,
Nunca disse bem do mal
Nem negou a sua fé.

Também não sabe mentir,
Mostrar-se triste ou fingir
Que sofre como os demais
O que no seu entender
Tinha ou tem de acontecer,
É destino dos mortais.

No que toca ao português,
A língua que o povo fez
E que julga falar bem,
Diz tudo como aprendeu
Quando com o rabo ao léu
Fugia de casa à mãe.

Discute com toda a gente,
Desde o sensato ao demente;
Desde o ministro ao porteiro,
Sente-se sempre à vontade,
Quando defende a verdade
Ou desanca um embusteiro.

Como outrora S.José,
Na oficina em Nazaré,
Ao lado do seu Jesus,
Também ele é carpinteiro
E trabalha o dia inteiro
Abraçado à sua cruz.

Ainda o Sol não alveja
Na torre da velha Igreja
Abrindo as portas ao dia,
Já o tio Quinta-Feira
Saíu de ao pé da lareira,
Onde há pouco se aquecia.

Já passando dos oitenta,
Vai buscar a ferramenta
Com que ganha o negro pão;
Vai cumprir as leis da vida
Que, apesar de tão comprida,
Jamais a passou em vão.

Com suas mãos calejadas,
Faz as obras desejadas
Com a maior perfeição;
Há-de ser sempre lembrado
Quando um dia for chamado
A cumprir outra missão.

Guitarra do "tio Quinta-Feira".

Placa comemorativa

Vivaldo Quaresma
Abril-2010

*NOTA: O Acordo Ortográfico de 1945 (o mesmo que esteve na base da transformação da palavra Bemfeita, com "m", em Benfeita, com "n") fez a distinção entre o "g" palatal e o "j", dada a homofonia existente entre certas consoantes, resultando que a palavra mangerico, com "g" passou a ser escrita com "j". Manjerico é, portanto, a forma correcta e actual de escrever a palavra.